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quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Política, prá quê?


Lembro-me de meu pai pedir para que ficássemos em silêncio durante o telejornal das 20:00h, quando conversávamos diante do televisor. Como micro-comerciante e cidadão, acompanhava com grande interesse ao noticiário político/econômico. Em 1.986, durante o governo do presidente Sarney – primeiro presidente civil após mais de duas décadas de ditadura militar – eu estudava no Colégio Salesiano de minha cidade natal e assisti pela TV da cantina ao pronunciamento do ministro de Estado, informando sobre a decretação do Plano Cruzado. A notícia repercutiu como uma declaração de guerra, tamanho impacto que causou à população. Quando cheguei em casa, meu pai permanecia "plantado" defronte à TV, até o último telejornal, já no início da madrugada. Na ocasião, congelaram-se os preços e salários; aumentaram os impostos; tabelaram os juros; a inflação chegou a zero e o consumo explodiu. Apesar das dificuldades de um arrimo de família pobre do interior, meu pai assinou "às duras penas" por mais de vinte anos um grande jornal da capital paulista, com o nobre intuito de manter seu lar bem informado. Avalizou, torceu, acompanhou e sofreu com os malogrados Plano Cruzado 2 (1986); Plano Bresser (1987); Plano Verão (1989); Planos Collor 1 e 2 (1990/1991); e o derradeiro que o combaliu, Plano Real (1994). À época, meu pai já era comerciante havia vinte e oito anos, e tinha se acostumado a sobreviver com a inflação e outras mazelas econômicas. Juntamente com uma legião de outros pequenos comerciantes, não teve nenhum apoio ou esclarecimento de como adaptar-se à súbita "estabilidade", e nunca mais recuperou a saúde do seu negócio. Após apelar para tudo (todas as leoninas armadilhas do sistema financeiro), e dedicar-se exaustivamente ao trabalho em seu comércio por mais quatro anos, resignou-se. Agarrou-se a uma desmedida crença religiosa, e desistiu de acreditar em "coisas de política". Mesmo presenciando a brava luta de meu pai contra as inabilidades e experimentações políticas, e compreendendo seu profundo desgosto com a classe, sinto saudades de sua dedicação e perseverança, quando não havia optado em apenas orar por esse país. Contudo, tenho grande temor quando vejo a maioria da população jovem do Brasil, ignorando e negligenciando a política, individualizando egoisticamente sua conduta, alienando-se em entretenimentos vazios, assistindo a tudo sem postura crítica, acostumando-se a escândalos e malversação do bem público, com lamentável apatia. Realmente não compreendo quando pessoas descrevem seu perfil no site de relacionamentos Orkut, no item que questiona sua participação política, assinalando a opção "apolítico" (como se isso fosse possível), orgulhando-se e procurando eximir-se de qualquer culpa pelo mal andamento de nosso país. Admito que é muito difícil não desanimar e capitular frente a tantas más notícias, discursos demagógicos, práticas escusas. Nunca os políticos se pareceram tanto, e é raro destacar matizes que fujam do cinza dos nossos representantes em todas as instâncias. Mas, existem duas maneiras de mesmo peso para cometer uma falta grave: a ação e a omissão; e omitir-se é o mesmo que avalizar incondicionalmente esse estado de coisas. É imprescindível aliar as duas armas mais importantes – talvez as únicas – a que um cidadão pleno pode lançar mão nos dias atuais: conhecimento e participação política direta. Informação é combustível poderoso que faz mover as engrenagens da sua vida, por esse motivo ela é tão negligenciada. Fazer política não é meramente participar daquele concurso esporádico, e escolher candidato através do "show de horrores" do oneroso horário político. Em tempos de sobrevivência, não pretendo recriminar ninguém, e sei o quanto é cruel essa luta cotidiana para a maioria da população. Aceite o pão, aceite o circo, mas não se esqueça de exigir o livro, que certamente abrirá seus olhos e o tornará crítico, cético, exigente e com chances de melhorar sua árdua existência. Esse lamaçal tem que acabar, só depende de você!
O ateniense Péricles discursou com orgulho aos seus concidadãos, após a guerra do Peloponeso: "Nós somos o único povo a pensar que um homem alheio à vida política, não deve ser considerado como um cidadão tranqüilo, mas como um cidadão inútil".
Um abraço!
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P.s.:
Que tristeza me causou, constrangimento,
Vergonha, vexame, catatonia...
Nós que acompanhamos desde o surgimento,
Lutas, tomada do poder, ascensão e agonia.
Dessa confusa corte, outrora combatente
Onde figurava companheira tão humilde,
Ver seu nome execrado publicamente,
Indefensável, por ávidas "bocas de Matilde".

4 comentários:

Fábio Shiraga disse...

Olá, Djalma. Tudo bem?
Eu costumava dizer que era apolítico, mas à partir do momento que descobri que a gente faz muita política diariamente, seja na escolha do jornal que vai ler, ou o disco que vai colocar para tocar, se vai deixar de ver a Ivete Sangalo para ver o Bob Dylan, são todas escolhas políticas, né? Logo, não me chamo mais apolítico.
Mas acredito que os que se intitulam apolíticos, o fazem mais por uma revolta com essa coisa que anda banal demais; podem até se informar sobre política e saber em quem irão votar, mas preferem a distância.

Grande abraço.

Anônimo disse...

Ah se os "jornalistas" e "analistas políticos"de plantão tivessem a metade de seu discernimento e talento, nossos ouvidos seriam poupados de manipulações reles.
Esse texto me lembrou (ou lembrou-me)como queiram, os velho e bom Otto Lara Rezende.
Beijos

Anônimo disse...

Pois é Djalma e eu que já fui uma "fiscal do Sarney", decepção por um lado aprendizado político por outro...
Não preciso nem dizer que este texto seu vai para minha sala de aula.
Djalma mei filho acredite com esse talento e competência tenho certza de que a vida reserva-lhe maravilhosas surpresas. Deus te abençõe!

Anônimo disse...

vejo que continua na batalha Djalma, sei o qto isso lhe custa,mas ao mesmo tempo é o que te mantém vivo. Força irmão uma hora tudo passa a fazer sentido.
Grande abraço.